Mitomania como defesa num caso de personalidade histérica

04/06/2025

Mitomania como defesa num caso de personalidade histérica

Por Raique Almeida

            O artigo tem como objetivo principal analisar a mitomania como um mecanismo de defesa em um paciente com personalidade histérica, destacando as implicações psicodinâmicas dessa manifestação.

O estudo descreve uma paciente do sexo feminino que apresenta um padrão persistente de fabulação, caracterizado por relatos fantasiosos e inconsistentes com a realidade, sem motivação aparente para ganhos secundários. A paciente demonstra uma tendência compulsiva à mentira, mesmo quando confrontada com evidências que desmentem suas afirmações, o que sugere uma dissociação entre suas narrativas e a realidade objetiva. Esse comportamento é interpretado como uma tentativa inconsciente de lidar com conflitos internos e ansiedades, funcionando como um mecanismo de defesa para manter a autoestima e evitar o enfrentamento de sentimentos dolorosos.

A análise do caso é fundamentada na teoria psicanalítica, considerando que a mitomania, nesse contexto, não é apenas um sintoma isolado, mas uma expressão de conflitos intrapsíquicos mais profundos. A paciente utiliza a fabulação como uma forma de construir uma realidade alternativa que lhe proporciona segurança emocional, evitando o confronto com aspectos de sua vida que lhe causam sofrimento. Essa construção fantasiosa é vista como uma defesa contra a ansiedade e a insegurança, características comuns em personalidades histéricas.

O artigo destaca a importância de compreender a mitomania não apenas como um comportamento patológico, mas como um recurso psíquico utilizado pelo indivíduo para lidar com suas dificuldades emocionais. Nesse sentido, a mentira patológica é interpretada como uma tentativa de reorganizar a realidade interna do paciente, permitindo-lhe manter uma imagem de si mesmo mais aceitável e protegida das críticas externas. Essa perspectiva enfatiza a necessidade de uma abordagem terapêutica que vá além da correção do comportamento mentiroso, buscando entender as motivações subjacentes e os conflitos que levam à adoção desse mecanismo de defesa.

O estudo também aborda as implicações diagnósticas da mitomania, ressaltando a importância de diferenciá-la de outras condições psiquiátricas, como a psicose, onde a perda de contato com a realidade é mais pronunciada. No caso apresentado, a paciente demonstra consciência, ainda que parcial, da natureza fictícia de suas narrativas, o que a distingue de quadros psicóticos. Essa distinção é crucial para a definição de estratégias terapêuticas adequadas, que considerem as particularidades do funcionamento psíquico da paciente.

Em termos terapêuticos, o artigo sugere que o tratamento da mitomania em pacientes com personalidade histérica deve envolver uma abordagem psicodinâmica, focada na exploração dos conflitos internos e na reconstrução da autoimagem do paciente. A terapia deve proporcionar um ambiente seguro e acolhedor, onde o paciente possa expressar suas emoções e refletir sobre suas experiências, facilitando a integração de aspectos dissociados de sua personalidade. Além disso, é fundamental trabalhar o desenvolvimento de mecanismos de enfrentamento mais adaptativos, que permitam ao paciente lidar com suas dificuldades sem recorrer à fabulação.

O artigo contribui para a compreensão da mentira patológica como um fenômeno complexo, enraizado em conflitos psíquicos profundos e utilizado como um recurso defensivo por indivíduos com determinadas estruturas de personalidade. A análise do caso clínico apresentado oferece descobertas valiosas para a prática clínica, destacando a importância de uma abordagem terapêutica que vá além da correção do comportamento, buscando entender e trabalhar as motivações subjacentes que levam à adoção da mitomania como mecanismo de defesa.

Referência:

UCHOA, Darcy Mendonça. Mitomania como defesa num caso de personalidade histérica. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, São Paulo, v. 5, n. 3, p. 270-276, set. 1947.

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