As profundezas do vício: "Quando eu quiser, eu paro!"
16/06/2025

Por Raique Almeida
O artigo aborda os mecanismos neurobiológicos, psicológicos e sociais que fundamentam os processos de dependência química. Os autores partem da crítica à percepção comum de que o vício é simplesmente uma questão de força de vontade, desmistificando a ideia de que o indivíduo adicto pode interromper o consumo de substâncias a qualquer momento. Através de uma abordagem interdisciplinar, o artigo discute como o uso repetido de drogas afeta circuitos cerebrais específicos, especialmente aqueles ligados ao sistema de recompensa, como o núcleo accumbens, a amígdala e o córtex pré-frontal.
Esses sistemas são responsáveis por sensações de prazer, motivação e tomada de decisões, sendo profundamente impactados pelas substâncias psicoativas, o que leva à dificuldade de autocontrole e ao ciclo compulsivo do uso. Além do componente neurológico, os autores também ressaltam a influência de fatores emocionais, culturais e históricos no desenvolvimento do vício. O artigo destaca a importância de compreender o vício como uma doença multifacetada, que exige abordagens terapêuticas integradas, indo além da simples abstinência e considerando aspectos psicossociais e neurobiológicos.
A metáfora do iceberg é utilizada para representar a complexidade do fenômeno o uso visível da droga seria apenas a ponta, enquanto emoções reprimidas, traumas e condições sociais precárias compõem a parte submersa e mais determinante do comportamento aditivo. Nesse sentido, a proposta é que o tratamento da dependência envolva não apenas a desintoxicação física, mas também o enfrentamento das causas profundas do sofrimento psíquico.
O artigo também reflete sobre como o discurso biomédico e a criminalização do adicto obscurecem a compreensão do vício como fenômeno humano, alimentando estigmas que dificultam a reintegração social e a busca por ajuda. Assim, os autores defendem a importância de políticas públicas baseadas na redução de danos, na escuta qualificada e na reinserção social como estratégias mais eficazes para lidar com a dependência. Ao final, a obra convida o leitor a abandonar visões moralistas e simplistas sobre o consumo de drogas, reconhecendo a dependência como uma condição que exige cuidado, compreensão e políticas de saúde pública comprometidas com a dignidade e a complexidade do ser humano.
Referência:
ROLNIK, Ariel Lorber; SHOLL-FRANCO, Alfred. As profundezas do vício: "Quando eu quiser, eu paro!". Ciências & Cognição, Rio de Janeiro, v. 9, p. 135-145, nov. 2006.