O Campo de Atenção ao Dependente Químico

30/05/2025

O Campo de Atenção ao Dependente Químico

Por Raique Almeida

            O artigo oferece uma análise crítica sobre a constituição e as disputas que permeiam o campo de atenção ao adicto no Brasil. Os autores utilizam o referencial teórico de Pierre Bourdieu para compreender esse campo como um espaço de lutas simbólicas e materiais entre diferentes atores sociais que buscam impor suas perspectivas e práticas.

Inicialmente, os autores destacam que o campo de atenção ao adicto é formado por diversos atores sociais, como profissionais de saúde, juristas, religiosos, familiares e adictos, cada um com suas estratégias e interesses específicos. Esses atores disputam a definição legítima do problema das drogas e das formas adequadas de tratamento e cuidado. Essa disputa é influenciada por fatores históricos, políticos, econômicos e culturais, que moldam as políticas públicas e as práticas institucionais.

O texto traça uma genealogia do campo, destacando a hegemonia do modelo biomédico na compreensão da dependência química, que a trata como uma doença individual a ser curada por meio de intervenções médicas. Esse modelo, baseado em uma visão mecanicista e reducionista da saúde, foi dominante até a implementação do Sistema Único de Saúde (SUS) e da reforma psiquiátrica no Brasil. Com essas mudanças, emergiram novas abordagens, como a redução de danos e a atenção psicossocial, que buscam compreender o uso de drogas em seus contextos sociais e culturais e promover a autonomia dos adictos.

Os autores também analisam a influência do discurso jurídico-político na conformação do campo, especialmente no que diz respeito à legislação sobre drogas. A Lei nº 6.368/76, por exemplo, estabeleceu uma abordagem repressiva e punitiva, criminalizando o uso de drogas e priorizando a internação compulsória como forma de tratamento. Posteriormente, a Lei nº 11.343/2006 trouxe avanços ao diferenciar adictos de traficantes e prever medidas alternativas à prisão, mas ainda mantém elementos do paradigma proibicionista.

O artigo destaca a tensão entre as abordagens centradas na abstinência total e aquelas que adotam a redução de danos como estratégia de cuidado. Enquanto as primeiras tendem a promover a exclusão social dos adictos, afastando-os de seus contextos familiares e comunitários, as segundas buscam integrar os adictos à sociedade, reconhecendo suas singularidades e promovendo sua cidadania. Essa tensão reflete disputas mais amplas sobre o papel do Estado, da sociedade civil e das instituições religiosas na formulação e implementação de políticas sobre drogas.

Os autores argumentam que o campo de atenção ao adicto permanece em disputa, com diferentes modelos de cuidado coexistindo e competindo por legitimidade. Essa situação exige uma reflexão crítica sobre as práticas institucionais e as políticas públicas, visando a construção de um campo mais democrático, inclusivo e comprometido com os direitos humanos.

Em suma, o artigo oferece uma contribuição significativa para a compreensão das complexidades e contradições que permeiam o campo de atenção ao adicto no Brasil. Ao adotar uma perspectiva sociológica e crítica, os autores iluminam as disputas simbólicas e materiais que moldam as políticas e práticas nesse campo, apontando caminhos para a construção de abordagens mais justas e eficazes.

Referência:

ALARCON, Sergio; BELMONTE, Pilar Rodriguez; JORGE, Marco Aurélio Soares. O campo de atenção ao dependente químico. In: ALARCON, Sergio; JORGE, Marco Aurélio Soares (Orgs.). Álcool e outras drogas: diálogos sobre um mal-estar contemporâneo. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2012. p. 63–81.

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