População em situação de rua, vulnerabilidades e drogas: uma revisão sistemática
08/06/2025

Por Raique Almeida
O artigo apresenta uma análise abrangente das produções científicas sobre o uso de drogas entre pessoas em situação de rua, com ênfase nas vulnerabilidades sociais que atravessam essa população. A pesquisa adota o método de revisão sistemática e abrange 79 estudos, extraídos de bases de dados como SciELO Brasil, PePSIC, PubMed e Redalyc. A proposta central do artigo é identificar como a literatura tem abordado a relação entre a condição de rua, o uso de substâncias psicoativas e os fatores sociais implicados nesse fenômeno, como pobreza, estigma, raça e exclusão.
Os resultados demonstram uma diferença significativa entre a produção científica latino-americana e a norte-americana. Nos Estados Unidos, os estudos são predominantemente quantitativos, com foco na mensuração de riscos específicos associados ao uso de drogas, como infecções, overdoses e criminalização. Já na América Latina, observa-se maior valorização das abordagens qualitativas, com destaque para metodologias participativas, como entrevistas em profundidade, observação etnográfica e grupos focais, que buscam compreender o contexto urbano e histórico que molda as trajetórias de vida das pessoas em situação de rua. Essa abordagem permite considerar as experiências subjetivas e os processos sociais que permeiam o uso de substâncias.
O artigo também chama atenção para a fragilidade conceitual presente nos estudos analisados, especialmente no que diz respeito às categorias de “risco” e “vulnerabilidade”. Os autores apontam que essas noções, embora recorrentes, muitas vezes são tratadas de maneira isolada, sem articulação com os múltiplos determinantes sociais que influenciam a vida dessa população. Diante disso, os autores defendem a construção de uma nova categoria analítica que permita uma compreensão mais integrada do fenômeno, considerando aspectos estruturais como desigualdade social, racismo, violências institucionais e ausência de políticas públicas eficazes.
A conclusão do artigo propõe uma revisão crítica dos modelos de intervenção que tradicionalmente têm pautado as ações voltadas à população em situação de rua. Os autores sugerem a formulação de estratégias baseadas em uma perspectiva intersetorial, que envolva políticas de saúde, assistência social, habitação e direitos humanos, sempre pautadas pela redução de danos, pela escuta qualificada e pelo respeito às singularidades dos sujeitos. Além disso, destacam a importância de romper com visões moralizantes e individualizantes que culpabilizam os adictos, reforçando estigmas e barreiras ao acesso a serviços. A revisão sistemática apresentada pelos autores contribui de maneira relevante para a compreensão crítica da complexa relação entre rua, drogas e vulnerabilidade social, apontando caminhos para uma atuação mais justa, eficaz e humanizada no campo das políticas públicas.
Referência:
MENDES, Kíssila Teixeira; RONZANI, Telmo Mota; PAIVA, Fernando Santana de. População em situação de rua, vulnerabilidades e drogas: uma revisão sistemática. Psicologia & Sociedade, Belo Horizonte, v. 31, e169056, 2019.