O ciúme enquanto sintoma do transtorno obsessivo-compulsivo
17/05/2025

Por Albina Rodrigues Torres, Ana Teresa de Abreu Ramos-Cerqueira e Rodrigo da Silva Dias
O artigo publicado na Revista Brasileira de Psiquiatria, analisa o ciúme patológico (CP) como uma manifestação possível do transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). O ciúme patológico é definido como uma preocupação persistente, irracional e muitas vezes infundada com a possibilidade de infidelidade do parceiro, resultando em comportamentos disfuncionais e sofrimento significativo. Tradicionalmente, esse tipo de ciúme foi interpretado dentro de outros quadros clínicos, como transtornos delirantes, transtornos de personalidade ou mesmo como uma resposta culturalmente aceita em certos contextos, o que dificultou sua categorização como parte do espectro obsessivo-compulsivo.
O estudo parte da premissa de que o ciúme, quando associado a ideias obsessivas de infidelidade seguidas por comportamentos compulsivos como investigações, interrogatórios ou vigilância sobre o parceiro, pode ser melhor compreendido como uma manifestação do TOC. Os autores apresentam e discutem quatro casos clínicos nos quais o ciúme surge com características obsessivo-compulsivas. Em todos os casos, os pacientes demonstravam pensamentos intrusivos e persistentes sobre a possível infidelidade de seus parceiros, que não conseguiam controlar, mesmo reconhecendo a irracionalidade dessas ideias. Esses pensamentos causavam grande angústia e levavam a rituais compulsivos, como telefonemas constantes, verificação de pertences, ou questionamentos repetitivos ao parceiro.
Um ponto relevante abordado pelos autores é que, mesmo na ausência de uma clara percepção da irracionalidade do pensamento, ou seja, quando as ideias não são completamente egodistônicas, o quadro ainda pode se enquadrar no espectro do TOC. Essa consideração amplia a compreensão diagnóstica e permite que pacientes que antes eram tratados sob outras classificações possam se beneficiar de abordagens terapêuticas eficazes no TOC. Nesse sentido, os autores destacam que o reconhecimento do ciúme patológico como um sintoma do TOC abre espaço para o uso de inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), como a fluoxetina ou a clomipramina, além de intervenções baseadas na terapia cognitivo-comportamental (TCC), que já demonstram eficácia comprovada no tratamento de obsessões e compulsões.
O artigo conclui que o diagnóstico diferencial do ciúme patológico deve incluir a possibilidade de TOC, especialmente quando o conteúdo do ciúme se apresenta como pensamentos intrusivos e repetitivos que causam sofrimento e são seguidos por comportamentos compulsivos. Essa abordagem pode não apenas melhorar a acurácia diagnóstica, mas também oferecer melhores perspectivas terapêuticas para indivíduos que, frequentemente, sofrem em silêncio e apresentam prejuízo significativo em suas relações afetivas e vida cotidiana. Ao reconhecer o ciúme obsessivo como parte do TOC, amplia-se a possibilidade de tratamento eficaz e de alívio do sofrimento psíquico desses pacientes.