Adicção e Honestidade: Uma Análise à Luz dos Princípios da Recuperação e das Contribuições da Psicol
12/08/2025

Por Raique Almeida
A adicção, compreendida como um padrão compulsivo de comportamento em que há perda de controle sobre o uso de substâncias ou práticas, é uma condição multifacetada que afeta dimensões biológicas, psicológicas e sociais do indivíduo (American Society of Addiction Medicine, 2020). No processo de recuperação, a honestidade ocupa lugar central, tanto como princípio ético quanto como ferramenta terapêutica para romper o ciclo de negação característico da dependência química.
Sob a perspectiva da Psicologia Humanista, Carl Rogers (1961) defende que a congruência, entendida como alinhamento entre experiência interna e expressão externa, é elemento essencial para o crescimento pessoal. Essa congruência implica uma postura de autenticidade, que, no contexto da adicção, se aproxima diretamente da prática da honestidade. Ao reconhecer fragilidades e admitir a necessidade de ajuda, o indivíduo cria as condições para um processo genuíno de mudança, aproximando-se do que Rogers denomina “tendência atualizante”, ou seja, a capacidade inata de se desenvolver em direção ao seu potencial pleno.
Nos programas baseados nos 12 passos, como os de Alcoólicos Anônimos (AA), a honestidade é apresentada como um fundamento da sobriedade, sendo explicitada já no primeiro passo: “Admitimos que éramos impotentes perante o álcool, que nossas vidas tinham se tornado ingovernáveis” (Alcoólicos Anônimos, 2001, p. 21). Essa admissão implica romper com o mecanismo defensivo da negação, comum nos estágios iniciais da doença (Miller; Rollnick, 2013). Assim, a honestidade não é apenas uma virtude moral, mas um recurso terapêutico que favorece o insight e fortalece a adesão ao tratamento.
A literatura científica reforça que a capacidade de se autoavaliar de maneira honesta correlaciona-se positivamente com a motivação para a mudança e a redução de recaídas (Moos; Moos, 2006). Quando o indivíduo desenvolve a habilidade de reconhecer padrões disfuncionais sem distorção, cria-se espaço para a elaboração de novas estratégias de enfrentamento, alinhadas ao que a Psicologia Humanista considera uma vivência plena e integrada.
Portanto, ao integrar os referenciais dos 12 passos e da abordagem humanista, percebe-se que a honestidade, no contexto da recuperação da adicção, transcende a simples verdade verbal. Trata-se de um compromisso profundo com a própria realidade interna, um ato de coragem que sustenta o processo de reabilitação e promove autonomia. A prática constante dessa postura não apenas auxilia na manutenção da sobriedade, mas também potencializa a construção de uma vida mais coerente com os valores pessoais, sustentando o bem-estar de forma duradoura.
Referências
ALCOÓLICOS ANÔNIMOS. Alcoólicos Anônimos: O Livro Básico. 4. ed. São Paulo: JUNAAB, 2001.
AMERICAN SOCIETY OF ADDICTION MEDICINE. Definition of Addiction. Rockville: ASAM, 2020. Disponível em: https://www.asam.org/. Acesso em: 12 ago. 2025.
MILLER, W. R.; ROLLNICK, S. Entrevista Motivacional: Ajudando as Pessoas a Mudar. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013.
MOOS, R. H.; MOOS, B. S. Participation in treatment and Alcoholics Anonymous: a 16-year follow-up of initially untreated individuals. Journal of Clinical Psychology, v. 62, n. 6, p. 735–750, 2006.
ROGERS, C. On Becoming a Person. Boston: Houghton Mifflin, 1961.