Benedita, de Elza Soares: o grito das marginalizadas

01/05/2025

Benedita, de Elza Soares: o grito das marginalizadas

Por Raique Almeida

            A música “Benedita”, lançada por Elza Soares em 2015 no álbum A Mulher do Fim do Mundo, é uma obra intensa e politicamente carregada, que trata com crueza e poesia das violências sofridas por corpos marginalizados na sociedade brasileira. O disco marca uma virada estética e temática na carreira de Elza, incorporando influências do rock experimental, punk e samba, com letras que tocam diretamente em feridas abertas da realidade social. “Benedita” é uma das faixas mais impactantes, pois humaniza e celebra figuras constantemente invisibilizadas: travestis, negras, pobres e adictas.

A música narra a história de Benedita, personagem que representa milhares de mulheres trans e travestis que enfrentam a violência cotidiana, o preconceito e a exclusão. A letra revela com sensibilidade e dureza a trajetória de Benedita, marcada por sofrimento e resistência. Ao mencionar a internação em clínicas, o uso de drogas, a violência policial e institucional, Elza dá voz a quem raramente é ouvida. A própria escolha do nome “Benedita” com ressonâncias religiosas e populares carrega ambiguidade: ao mesmo tempo uma benção e um destino marcado por dor.

Musicalmente, a canção combina elementos eletrônicos e guitarras distorcidas com a interpretação visceral de Elza, que canta como se gritasse as dores do mundo. A tensão instrumental acompanha a letra, criando um ambiente sonoro que remete ao caos urbano e à marginalidade. A dramaticidade do arranjo contribui para que o ouvinte não apenas escute, mas sinta a angústia, a luta e a humanidade de Benedita.

A mensagem central de “Benedita” é clara: trata-se de uma denúncia poética contra a transfobia, o racismo e o abandono social. Ao invés de oferecer uma visão romantizada ou simplista, a música escancara a realidade de exclusão, mas também aponta para a resistência e a dignidade dessas vidas. Elza Soares, com sua voz potente e sua trajetória marcada por dores semelhantes, encarna a figura da artista que não apenas canta, mas testemunha. Ao interpretar “Benedita”, ela se alia às lutas das minorias e transforma sua arte em denúncia social.

Assim, “Benedita” é muito mais que uma música é um manifesto. É a afirmação de que a arte pode e deve servir como instrumento de enfrentamento das desigualdades e como espaço de escuta para os silenciados. Elza Soares, aos 85 anos à época do lançamento, mostrou que ainda era como sempre foi uma mulher à frente do seu tempo, dando voz ao fim do mundo para que, talvez, um novo começo possa emergir.

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