Recaídas na Drogadição: Uma Via Para Repensar a Atenção à Saúde

24/06/2025

Recaídas na Drogadição: Uma Via Para Repensar a Atenção à Saúde

Por Raique Almeida

            O artigo propõe uma reflexão crítica sobre o fenômeno das recaídas no contexto da drogadição, abordando-o como um elemento estruturante e revelador de fragilidades no modelo de atenção à saúde vigente. A partir de uma perspectiva que tensiona os limites da abordagem biomédica tradicional, as autoras analisam como as recaídas, frequentemente tratadas como retrocessos no processo terapêutico, podem, ao contrário, funcionar como disparadores de novos entendimentos sobre os processos de cuidado em saúde, sobretudo no campo da atenção psicossocial.

A análise apresentada parte da constatação de que as recaídas são constantemente associadas ao fracasso terapêutico ou à falta de engajamento do sujeito em tratamento, o que contribui para sua estigmatização e exclusão de redes de cuidado. Essa visão reducionista tende a responsabilizar o indivíduo pelo insucesso do processo, desconsiderando os condicionantes sociais, econômicos e culturais que permeiam a experiência da drogadição. As autoras argumentam que tal enfoque compromete a efetividade das práticas de cuidado e impede a construção de vínculos sustentáveis entre os adictos e os serviços de saúde, especialmente no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS).

Com base em uma abordagem qualitativa, as autoras realizam uma análise teórica sobre os sentidos atribuídos às recaídas por profissionais de saúde e adictos, destacando a importância da escuta sensível, do acolhimento contínuo e da construção de projetos terapêuticos singulares. Nesse sentido, a recaída é compreendida não como uma interrupção do tratamento, mas como uma possibilidade de ressignificação do processo terapêutico, exigindo uma postura ética e relacional por parte dos profissionais e serviços envolvidos.

A proposta do artigo caminha na direção de uma atenção mais integral e humanizada, que reconheça os sujeitos em sua complexidade e historicidade, rompendo com a lógica punitiva e disciplinadora que ainda permeia muitas práticas no campo das drogas. As autoras enfatizam a importância de práticas clínicas que se afastem do ideal de cura como objetivo final e passem a valorizar o acompanhamento longitudinal, a escuta ativa e a corresponsabilização dos atores envolvidos. Assim, o texto propõe uma revisão crítica do modo como os dispositivos de cuidado operam frente às recaídas, apontando para a necessidade de transformações nos modos de produção da atenção e na organização dos serviços.

Conclui-se, portanto, que as recaídas, longe de representarem meramente retrocessos ou falhas individuais, são eventos que desafiam os modelos tradicionais de tratamento e convidam à reconstrução das práticas de cuidado em saúde mental e atenção às drogas. O enfrentamento das recaídas exige, segundo as autoras, uma mudança de paradigma que envolva não apenas os profissionais, mas toda a estrutura dos serviços de saúde, comprometendo-se com a singularidade dos sujeitos e com a complexidade dos processos que envolvem o uso problemático de substâncias. O artigo contribui, assim, para o debate sobre a necessidade de uma atenção mais dialógica, ética e comprometida com a inclusão social dos adictos, reafirmando o caráter político e coletivo do cuidado em saúde.

Referência:

GARCIA, Edna Linhares; ZACHARIAS, Dulce Grasel; ARAÚJO, Bruna Rocha de. Recaídas na drogadição: uma via para (re)pensar a atenção à saúde. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 37, spe. 1, p. 182–191, dez. 2013.

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