Reflexão sobre a música Pacto – Expressão Ativa
29/04/2025

Por Raique Almeida
A música "Pacto", do grupo Expressão Ativa, é uma obra visceral que transcende os limites do rap como forma de entretenimento, assumindo o papel de denúncia social e confissão existencial. Com versos densos e carregados de emoção, a canção mergulha no drama de jovens marcados por uma realidade violenta, onde a marginalização, a ausência de oportunidades e o cotidiano opressor constroem um ciclo quase inescapável de dor, crime e morte. O “pacto” ao qual a música se refere é, na verdade, uma entrega simbólica e muitas vezes literal à lógica da sobrevivência em um mundo onde o afeto, a esperança e o futuro parecem estar sempre à margem.
Desde os primeiros versos, percebemos que não se trata apenas de um relato de vida, mas de um grito contido de quem foi empurrado para os limites da sociedade. A letra expõe uma juventude que, por falta de opções, firma pactos silenciosos com o tráfico, com a violência, com o próprio sofrimento. Mas há, paradoxalmente, uma consciência crítica nessa entrega: o eu lírico sabe que está sendo consumido por essa realidade, mas parece não ver outra saída. Esse dilema gera um peso existencial profundo, que ecoa em cada palavra, em cada batida.
O tom da canção é confessional, quase como uma carta de despedida ou um pedido de socorro. A ideia de um “pacto com o demônio” não deve ser interpretada literalmente, mas como metáfora para a escolha forçada de um caminho destrutivo diante do abandono social. O sistema, como inimigo invisível, aparece como um dos grandes responsáveis por esse pacto: escolas que não educam, ausência do Estado nas periferias, a criminalização precoce de corpos negros e pobres, e a falta de políticas públicas que valorizem a vida.
No entanto, a música também carrega, em suas entrelinhas, uma proposta de reflexão e transformação. Ao expor com tanta sinceridade as dores de uma vivência marcada pela exclusão, "Pacto" convida o ouvinte a olhar para além do preconceito, a enxergar o ser humano por trás da estatística. Há um clamor por empatia, por escuta, por acolhimento. É como se o artista dissesse: “não estamos pedindo desculpas, estamos pedindo socorro”.
Por fim, "Pacto" é uma música que exige do ouvinte não apenas escuta, mas postura. É impossível sair indiferente após ouvi-la. A força das palavras, a dor embutida na narrativa e a potência crítica da canção nos obrigam a questionar: quantos jovens ainda precisarão fazer esse pacto para simplesmente existirem? O rap, neste contexto, cumpre sua função mais nobre: ser voz de quem quase nunca é ouvido, ser poesia nas trincheiras da vida real.