As drogas têm cor?

12/07/2025

As drogas têm cor?

 Por Raique Almeida 

           Este texto discute a relação entre drogas psicoativas e o conceito de "cor", analisando como a construção social, racial e política influencia a forma como determinadas substâncias e seus usuários são percebidos e tratados. A partir de uma abordagem crítica e interdisciplinar, busca-se evidenciar como o fenômeno da guerra às drogas no Brasil e em outros contextos está profundamente atravessado por marcadores raciais e sociais de desigualdade.

            Embora as drogas psicoativas não possuam cor em sentido literal, no imaginário social e nas políticas públicas, certos grupos raciais e socioeconômicos estão mais associados ao consumo e ao tráfico dessas substâncias. Tal associação revela não apenas estigmas, mas também estratégias de controle social. Segundo Wacquant (2007), há uma criminalização seletiva da pobreza e da negritude, particularmente nos centros urbanos, onde jovens negros são os principais alvos da repressão estatal sob o discurso de combate ao narcotráfico.

            Estudos realizados por Fiore (2012) apontam que a repressão às drogas no Brasil tem alvo preferencial as periferias racializadas. Enquanto o uso de substâncias como cocaína ou maconha entre jovens brancos e de classe média é frequentemente tratado como questão de saúde ou desvio individual, nas favelas o mesmo consumo é tratado como caso de polícia. Isso revela o que Vargas (2010) chama de “moral racializada da guerra às drogas”, em que o Estado constrói políticas com base em hierarquias raciais implícitas.

            Adicionalmente, a seletividade penal evidencia o racismo estrutural presente no sistema de justiça criminal brasileiro. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2023), cerca de 67% dos presos por tráfico de drogas no país são pessoas negras, mesmo quando a proporção do consumo entre brancos e negros é semelhante. Essa discrepância reforça a tese de que há uma cor atribuída socialmente ao consumo e comércio de drogas.

            Assim, a pergunta "as drogas têm cor?" deve ser entendida não em termos bioquímicos, mas como uma provocação crítica que revela o funcionamento desigual e racializado da repressão ao uso de substâncias psicoativas. A resposta, nesse sentido, é afirmativa as drogas têm cor na medida em que são usadas para justificar práticas de exclusão e controle sobre corpos negros e pobres.

Referências:

FIORE, Maurício. Usuários de drogas e políticas públicas: entre o cuidado e a repressão. São Paulo: Editora FGV, 2012.

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023.

VARGAS, João H. Costa. Nunca fomos parte: uma crítica ao multiculturalismo a partir da experiência negra no Brasil. Revista Estudos Afro-Asiáticos, Rio de Janeiro, v. 32, n. 1, p. 117-144, 2010.

WACQUANT, Loïc. As prisões da miséria. Trad. André Telles. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

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