Impaciência e Frustração na Dependência Química: Compreensão Neurocomportamental

09/07/2025

Impaciência e Frustração na Dependência Química: Compreensão Neurocomportamental

Por Raique Almeida

            A frustração recorrente e a impaciência observadas em pessoas em situação de dependência química são fenômenos que podem ser compreendidos a partir de aspectos neurobiológicos, comportamentais e familiares. A dependência altera profundamente o funcionamento cerebral, especialmente nos circuitos relacionados à dopamina, neurotransmissor ligado à sensação de prazer e recompensa. O cérebro do indivíduo adicto se condiciona a buscar gratificação imediata, tornando difícil o enfrentamento de situações que exigem espera, planejamento ou adiamento de recompensas.

            Além dos aspectos neuroquímicos, o contexto familiar exerce influência significativa nesse processo. Em muitos casos, o núcleo familiar atua de forma coadicta, atendendo prontamente às demandas do indivíduo em uso de substâncias, por medo de reações agressivas ou colapsos emocionais. Esse tipo de comportamento reforça ainda mais a expectativa de que tudo deve ser resolvido imediatamente, fortalecendo o padrão disfuncional de busca por soluções instantâneas e dificultando o desenvolvimento da tolerância à frustração.

            A impaciência, portanto, não se restringe a um traço de personalidade, mas é um sintoma da alteração cognitiva e emocional que a adicção promove. Quando o indivíduo não obtém o que deseja no tempo que espera, tende a reagir de forma exacerbada. Contudo, o confronto direto com essas reações pode gerar ainda mais caos, um ambiente propício para a recaída. Dessa forma, é necessário que a família se posicione de maneira assertiva, sem ceder às exigências imediatas, estabelecendo regras claras, rotinas fixas e limites bem definidos.

            A organização do cotidiano, a previsibilidade dos horários e das consequências, bem como a ausência de contradições nos acordos firmados, ajudam a reduzir o terreno fértil para a desordem emocional. Isso contribui para a responsabilização do indivíduo quanto às suas escolhas e reações. O reforço imediato, tão presente na lógica do consumo, precisa ser substituído gradualmente por experiências que valorizem o esforço e a espera, desenvolvendo assim recursos internos para lidar com as adversidades.

            É fundamental destacar que a frustração não deve ser evitada a qualquer custo, mas reconhecida como parte da experiência humana. O processo terapêutico e familiar deve ajudar o indivíduo a compreender que o sofrimento, a espera e o incômodo fazem parte da vida e podem ser enfrentados de maneira construtiva. Encorajar o adicto a nomear suas emoções e a expressar seus sentimentos verbalmente, em vez de recorrer ao consumo, é um passo essencial para a reintegração psíquica e emocional.

            Assim, lidar com a frustração não significa eliminar as dificuldades do caminho, mas ensinar a enfrentá-las sem recorrer às substâncias como via de escape. Essa mudança exige constância, paciência e firmeza por parte dos envolvidos no processo de recuperação, garantindo que o ambiente externo favoreça a estruturação interna e a autonomia emocional do indivíduo.

Referências:

OLIVEIRA, Maria Aparecida Penso de; LARANJEIRA, Ronaldo. Prevenção e tratamento do uso de drogas: fundamentos para uma política brasileira. Brasília: Secretaria Nacional Antidrogas, 2006.

CARVALHO, Almir Del Prette de; DEL PRETTE, Zilda Aparecida Pereira. Dependência química: abordagem cognitivo-comportamental e habilidades sociais. Petrópolis: Vozes, 2010.

RIBEIRO, Luiz Fernando Tófoli. Neurobiologia das dependências químicas. FIGLIE, Neliana Buzi; BORDIN, Sonia; LARANJEIRA, Ronaldo. Aconselhamento em dependência química. São Paulo: Roca, 2004. p. 11–28.

BASSO, Cristiano. Família e dependência química: compreendendo a co-dependência. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2001.Parte superior do formulário

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