Artistas e o Uso de Drogas: Entre a Inspiração Criativa e o Sofrimento Psíquico

14/07/2025

Artistas e o Uso de Drogas: Entre a Inspiração Criativa e o Sofrimento Psíquico

Por Raique Almeida

            O uso de substâncias psicoativas por artistas é um fenômeno histórico que suscita debates complexos, envolvendo questões de saúde mental, criatividade e pressão social. A associação entre genialidade e comportamento desviante é frequentemente romantizada pela cultura popular, mas estudos revelam que o uso de drogas entre artistas está, muitas vezes, relacionado ao sofrimento psíquico, à busca de alívio emocional e à tentativa de lidar com as exigências da profissão. De acordo com Moura e Pillon (2007), artistas podem recorrer às drogas como forma de escapar da ansiedade, da insegurança e da instabilidade inerentes à vida artística, fatores que contribuem para a vulnerabilidade ao uso abusivo.

            A literatura aponta que, em muitos casos, a arte é utilizada como uma tentativa de canalizar angústias internas, e o consumo de substâncias pode surgir como facilitador desse processo criativo. Entretanto, embora algumas drogas sejam associadas ao aumento da performance ou à inspiração momentânea, seus efeitos deletérios sobre a saúde mental e física são amplamente documentados. Segundo Nappo, Galduróz e Raymundo (2011), artistas que fazem uso contínuo de substâncias apresentam maior risco de desenvolver transtornos mentais, como depressão, ansiedade e síndrome do pânico, o que compromete tanto a vida pessoal quanto a carreira.

            Além disso, a pressão do mercado artístico, com exigências de produtividade, inovação constante e exposição pública intensa, contribui para um cenário propício ao uso de drogas como válvula de escape. Conforme discutido por Lima e Werlang (2013), o meio artístico é permeado por uma cultura de permissividade que pode normalizar comportamentos autodestrutivos, dificultando o reconhecimento do problema e a busca por tratamento adequado. Essa dinâmica cria um ciclo de sofrimento que tende a se agravar com o tempo, especialmente quando não há redes de apoio ou intervenções terapêuticas eficazes.

            A romantização da figura do "artista torturado", comum na literatura e no imaginário social, também reforça estigmas que dificultam a abordagem crítica do tema. Acredita-se que o sofrimento impulsiona a criação, o que leva muitos artistas a resistirem ao tratamento por medo de perderem sua inspiração. Contudo, como demonstram estudos de Ferreira e Alencar (2015), a criatividade não depende do uso de substâncias, e é possível desenvolver processos criativos saudáveis a partir do cuidado com a saúde mental. Superar essa idealização é fundamental para a construção de políticas públicas e ações de saúde voltadas a esse grupo social específico.

            Em síntese, o uso de drogas por artistas deve ser compreendido dentro de um contexto multifatorial que envolve aspectos emocionais, sociais e culturais. Longe de ser uma escolha puramente hedonista ou estética, o consumo de substâncias aparece, em muitos casos, como resposta a dores subjetivas e estruturas profissionais adoecedoras. Assim, é fundamental promover uma abordagem interdisciplinar que una arte, saúde e psicologia, reconhecendo a complexidade da experiência artística sem negligenciar a necessidade de cuidados integrados.

Referências:

FERREIRA, A. M.; ALENCAR, E. M. L. S. Criatividade e saúde mental: uma revisão crítica da literatura. Psicologia em Estudo, v. 20, n. 2, p. 295-304, 2015.

LIMA, A. F.; WERLANG, B. S. G. Drogadição e processos criativos: uma análise psicológica de artistas. Revista Subjetividades, v. 13, n. 3, p. 842-855, 2013.

MOURA, Y. G.; PILLON, S. C. O uso de drogas entre artistas: percepções e experiências. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v. 15, n. esp, p. 800-805, 2007.

NAPPO, S. A.; GALDURÓZ, J. C. F.; RAYMUNDO, M. Uso de drogas e vida profissional de artistas brasileiros. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 33, n. 2, p. 150-156, 2011.

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