Drogas não convencionais: riscos emergentes e invisibilização social do uso abusivo

03/08/2025

Drogas não convencionais: riscos emergentes e invisibilização social do uso abusivo

Por Raique Almeida

            As drogas não convencionais, muitas vezes fora do radar das políticas públicas e da percepção social, representam um desafio crescente para a saúde coletiva. Estas substâncias, que incluem produtos de uso cotidiano com potencial psicoativo como medicamentos vendidos sem prescrição, solventes, substâncias químicas industriais, além de plantas alucinógenas utilizadas de forma recreativa são consumidas de maneira abusiva por diversos grupos sociais. Apesar de seu uso ser frequentemente naturalizado ou negligenciado, tais drogas possuem efeitos psíquicos e físicos severos, podendo causar dependência, danos neurológicos, cardiovasculares e comportamentais. De acordo com Carlini (2017), o consumo de substâncias psicoativas não tradicionais é marcado por uma percepção equivocada de segurança, especialmente entre adolescentes e populações em situação de vulnerabilidade.

            Essas drogas desafiam os modelos clássicos de prevenção e tratamento da dependência química, pois muitas vezes são de fácil acesso, têm baixo custo e não estão inseridas nas campanhas de combate às drogas ilícitas. Produtos como "lança-perfume caseiro", medicamentos ansiolíticos, cogumelos psilocibinos e até mesmo inalação de gás de isqueiro vêm sendo consumidos com frequência crescente, sendo invisibilizados pelos sistemas de saúde e justiça. Como afirma Fiore (2015), há uma lacuna significativa entre o perfil real dos usuários e os programas oficiais de atenção psicossocial, que muitas vezes não reconhecem esses consumos como potencialmente aditivos e destrutivos.

            A invisibilidade do uso de drogas não convencionais reflete também um problema ético e estrutural, já que atinge principalmente indivíduos em contextos de exclusão social, sem acesso a cuidados adequados ou suporte psicossocial. A abordagem desse fenômeno exige uma revisão das práticas de acolhimento, com estratégias que considerem a singularidade dos consumos, a diversidade cultural e os contextos de uso. A Política Nacional sobre Drogas, embora avance em aspectos de prevenção e cuidado, ainda carece de uma atualização que contemple essas substâncias emergentes com o mesmo rigor que aplica às drogas clássicas, como álcool, crack e cocaína.

            Portanto, compreender o consumo de drogas não convencionais é essencial para a elaboração de políticas públicas mais inclusivas e eficazes. É necessário superar a lógica binária entre lícito e ilícito e reconhecer que o sofrimento psíquico associado ao uso dessas substâncias exige respostas complexas, intersetoriais e humanizadas. A pesquisa científica e os serviços de saúde devem caminhar juntos para identificar, mapear e acolher essas novas formas de dependência, promovendo cuidado e cidadania para populações que historicamente permanecem à margem dos sistemas de proteção.

Referências

CARLINI, Elisaldo Luiz de Araújo. Atenção e cuidado aos usuários de substâncias psicoativas: novas abordagens, novas políticas. São Paulo: UNIFESP, 2017.

FIORE, Maurício. Uso de substâncias psicoativas e políticas públicas: entre a moralização e o cuidado. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 31, n. 4, p. 699-701, 2015.

BRASIL. Política Nacional sobre Drogas. Brasília: SENAD, 2019.

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