Impactos Silenciosos: Os Riscos Fisiológicos e Neurológicos do Uso Prolongado de Antidepressivos

29/07/2025

Impactos Silenciosos: Os Riscos Fisiológicos e Neurológicos do Uso Prolongado de Antidepressivos

Por Raique Almeida

            O uso de antidepressivos tem se tornado cada vez mais comum em virtude da crescente prevalência dos transtornos mentais, especialmente a depressão. Embora sejam essenciais para o tratamento de diversos quadros clínicos, o uso prolongado dessas medicações pode ocasionar efeitos adversos significativos no organismo. Os antidepressivos mais prescritos atualmente pertencem à classe dos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), como fluoxetina, sertralina e citalopram, e também os inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSN), como a venlafaxina e a duloxetina. Tais substâncias atuam diretamente no sistema nervoso central, promovendo alterações bioquímicas importantes que, ao longo do tempo, podem desencadear consequências fisiológicas e neurológicas (ANDRADE, 2010).

            Do ponto de vista fisiológico, diversos estudos indicam que o uso prolongado de antidepressivos pode acarretar alterações metabólicas, como ganho de peso, disfunções sexuais e distúrbios do sono. Segundo Lima e Silva (2017), pacientes em uso crônico de ISRS apresentam aumento do apetite e alterações no metabolismo lipídico, favorecendo quadros de obesidade e síndrome metabólica. Além disso, há evidências de que tais medicações interferem na produção de melatonina, prejudicando o ritmo circadiano e favorecendo a insônia ou sonolência excessiva diurna (DINIZ. 2016).

            No campo neurológico, há registros de sintomas cognitivos persistentes, como déficit de atenção e lentificação do pensamento, associados ao uso prolongado. Essas alterações estão ligadas à adaptação do cérebro às altas concentrações de neurotransmissores, especialmente serotonina, que, ao longo do tempo, pode levar à dessensibilização de receptores neuronais (MOREIRA; BENTO, 2013). Além disso, pacientes que fazem uso crônico de antidepressivos podem desenvolver dependência psicológica, dificultando a descontinuação do tratamento e promovendo sintomas de abstinência, como tonturas, irritabilidade e sensação de “choques elétricos” ao tentar interromper a medicação (BESAG, 2011).

            Outro ponto de preocupação refere-se aos efeitos cardiológicos. Embora menos comuns, certos antidepressivos podem prolongar o intervalo QT no eletrocardiograma, aumentando o risco de arritmias cardíacas, especialmente em pacientes com predisposição genética ou que utilizam outras medicações concomitantes (RODRIGUES. 2018). A longo prazo, essa alteração pode representar um risco importante para a saúde cardiovascular.

            Em termos de impacto psicossocial, a dependência do uso de antidepressivos pode gerar um ciclo de medicalização da vida, no qual o sofrimento psíquico é reduzido a uma questão exclusivamente biológica, desconsiderando-se fatores existenciais, sociais e espirituais. Como destaca Amarante (2007), o uso excessivo e prolongado dessas medicações pode levar à cronificação dos quadros depressivos, à medida que se substitui o enfrentamento das causas do sofrimento por um tratamento apenas farmacológico.

            Diante disso, torna-se fundamental a prescrição criteriosa dos antidepressivos, com acompanhamento multidisciplinar e reavaliações periódicas. O uso dessas medicações deve ser sempre associado a abordagens psicoterapêuticas e a estratégias de cuidado integral à saúde mental, de modo a minimizar os riscos à saúde física e psíquica do paciente. A compreensão dos danos potenciais do uso prolongado dos antidepressivos contribui para uma prática clínica mais responsável e ética, favorecendo o bem-estar e a autonomia dos indivíduos em sofrimento.

Referências

AMARANTE, P. Saúde mental e atenção psicossocial. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007.

ANDRADE, C. Inibidores seletivos da recaptação da serotonina: eficácia, segurança e tolerabilidade. Revista Brasileira de Psiquiatria, São Paulo, v. 32, supl.1, p. 73-79, 2010.

DINIZ, B. S. Transtornos do sono e uso de antidepressivos: relações bidirecionais. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, São Paulo, v. 74, n. 5, p. 412-418, 2016.

LIMA, L. D.; SILVA, C. A. Antidepressivos e ganho de peso: uma análise das evidências científicas. Revista de Ciências Médicas, Campinas, v. 26, n. 3, p. 213-218, 2017.

MOREIRA, A. L.; BENTO, C. A. Efeitos neurológicos dos antidepressivos: uma revisão atualizada. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, Rio de Janeiro, v. 62, n. 4, p. 312-318, 2013.

RODRIGUES, J. S. Antidepressivos e arritmias cardíacas: o que sabemos até agora? Revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, São Paulo, v. 28, n. 2, p. 145-152, 2018.

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