Uso e Comercialização de Drogas em Bailes Funk: Um Fenômeno Complexo nas Periferias Urbanas

16/07/2025

Uso e Comercialização de Drogas em Bailes Funk: Um Fenômeno Complexo nas Periferias Urbanas

Por Raique Almeida

            O baile funk, enquanto manifestação cultural e artística das periferias urbanas brasileiras, tem se consolidado como um espaço de resistência e identidade juvenil. Contudo, ao mesmo tempo em que expressa a vivência de sujeitos historicamente marginalizados, também se torna, em determinados contextos, palco para práticas ilícitas como o uso e a comercialização de substâncias psicoativas. Essa realidade tem sido objeto de crescente atenção acadêmica e midiática, especialmente no que diz respeito à sua relação com a violência, o tráfico de drogas e a atuação do Estado.

            O consumo de drogas em bailes funk é influenciado por múltiplos fatores sociais, incluindo a exclusão econômica, o acesso restrito a políticas públicas de lazer e cultura, e a ausência de perspectivas profissionais para a juventude periférica. A presença de substâncias como maconha, cocaína, ecstasy e lança-perfume nos eventos está associada tanto à busca por prazer quanto à tentativa de escapar das adversidades cotidianas. Nesse sentido, o uso de drogas nesses ambientes não pode ser analisado de forma isolada, mas como parte de uma lógica social marcada pela vulnerabilidade e pela precarização da vida.

            Já a comercialização de entorpecentes nesses espaços se insere em uma dinâmica mais ampla do narcotráfico nas comunidades. Os bailes, por vezes realizados com a anuência de facções criminosas, funcionam como pontos estratégicos de venda, onde o lucro é maximizado diante da grande concentração de pessoas. O tráfico se aproveita da informalidade desses eventos e da ausência ou omissão do poder público, que muitas vezes enxerga o baile funk mais como uma ameaça à ordem do que como uma expressão legítima da juventude. Essa postura institucional contribui para o estigma que recai sobre o funk e seus frequentadores, associando automaticamente essa cultura à criminalidade, o que dificulta a implementação de políticas públicas inclusivas.

            Embora a correlação entre bailes funk e a comercialização de drogas seja real em muitos casos, é essencial evitar generalizações. A criminalização do funk tem servido como instrumento de controle social sobre as populações periféricas, reforçando estereótipos racistas e classistas. Um olhar crítico e sensível sobre o fenômeno deve considerar tanto os aspectos problemáticos quanto as potências transformadoras desse tipo de manifestação cultural. Políticas públicas que articulem cultura, juventude, saúde e segurança são fundamentais para romper o ciclo de exclusão e violência que marca a realidade de muitos desses territórios.

            Assim, compreender o uso e o comércio de drogas nos bailes funk requer uma abordagem interdisciplinar, que leve em conta as contradições da sociedade brasileira e os desafios enfrentados pelas comunidades periféricas. Mais do que um problema a ser combatido com repressão, trata-se de uma questão social que exige escuta, diálogo e investimento em alternativas que respeitem os direitos e a dignidade das populações envolvidas.

Referências

BATISTA, Vera Malaguti. O medo na cidade do Rio de Janeiro: dois tempos de uma história. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
HIRATA, Daniel Veloso. Sobreviver na adversidade: mercado e formas de vida nas favelas cariocas. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2014.
DINIZ, André. Baile Funk: o som da favela. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2006.
NASCIMENTO, Érica Peçanha do. Funk-se quem quiser: cenas e cenários do funk carioca. São Paulo: Annablume, 2015.

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