De Volta ao Mundo: Como Seguir Firme Fora da Clínica

12/04/2025

De Volta ao Mundo: Como Seguir Firme Fora da Clínica

Por Raique Almeida

            Este conteúdo é direcionado para pessoas que acabaram de sair de uma clínica de reabilitação ou de uma comunidade terapêutica, ou que estão prestes a sair. Esse momento de transição, conhecido como ressocialização, é um dos mais delicados da recuperação. Por isso, é fundamental ter clareza sobre o que fazer para manter os resultados conquistados no tratamento e evitar recaídas.

Muitas pessoas, ao saírem de um tratamento, sentem-se bem. Estão mais fortes física e emocionalmente, e com isso surge uma sensação de alívio, até mesmo de vitória. De fato, concluir um tratamento é uma grande conquista. Mas é importante entender que a recuperação não termina com a alta. Na verdade, é aqui fora que ela realmente começa porque, diferentemente da clínica, agora os riscos são reais, estão por toda parte.

É comum, por exemplo, que durante o período de ressocialização, alguns encarem as visitas para casa como se fossem férias. Só que recuperação não tira férias. Quando alguém relaxa demais, abandona os hábitos saudáveis construídos no tratamento e perde a disciplina, os riscos aumentam significativamente.

Dentro da clínica, a rotina é estruturada: há horários para acordar, se alimentar, participar de grupos, estudar, trabalhar, fazer terapia, descansar. Já fora da clínica, a rotina tende a ser mais flexível há compromissos, demandas e outras responsabilidades. No entanto, quanto mais a pessoa conseguir manter dessa estrutura aprendida durante o tratamento, maiores são suas chances de se manter firme. Continuar com a terapia, com o acompanhamento médico, com os grupos de apoio e com práticas espirituais (se fizerem parte da vida dela) são formas de dar continuidade ao processo de recuperação.

Um cuidado essencial nesse período é com a chamada “falsa sensação de cura”. A pessoa se sente bem, percebe que o sofrimento diminuiu, que os pensamentos estão mais claros, e então começa a acreditar que o problema passou. Muitas vezes, isso leva à ideia de que é possível voltar a frequentar os mesmos lugares de antes, conviver com antigos amigos de uso, retomar antigos hábitos como se estivesse tudo resolvido. Mas essa percepção é perigosa. O fato de a vontade de usar ter desaparecido naquele momento não significa que ela não possa voltar. E voltar aos mesmos ambientes, às mesmas companhias e ao mesmo estilo de vida é uma receita para a recaída.

Outro ponto importante é o otimismo excessivo aquele otimismo que ignora os riscos e faz a pessoa se sentir “inquebrável”, como se nada mais pudesse derrubá-la. Esse tipo de pensamento leva a comportamentos perigosos, como frequentar bares, festas, encontros com antigos colegas de uso, sob a crença de que “agora é diferente”. Mas não é. O otimismo saudável é aquele que anda de mãos dadas com a realidade, com os pés no chão. Acreditar na mudança é fundamental, mas é preciso manter o cuidado e o respeito pelo processo.

Além disso, é importante estar atento aos comportamentos imaturos. Muitos recaem não apenas por causa de uma substância, mas por causa de atitudes que enfraquecem a estrutura da recuperação: irresponsabilidade, falta de rotina, procrastinação, falta de compromisso com trabalho ou estudos, ou mesmo a ausência de participação nas tarefas de casa. Esses comportamentos passam uma imagem negativa não apenas para quem está em recuperação, mas também para a família, que começa a duvidar da seriedade do processo.

A verdade é que, fora da clínica, a prevenção de recaídas precisa ser levada a sério. Ela inclui uma autoanálise diária: como está o humor? Há sinais de desânimo, irritação, desorganização? Há comportamentos que antes faziam parte da rotina de uso voltando a aparecer? É preciso fazer esse monitoramento contínuo.

Frequentar grupos, fazer terapia, manter um estilo de vida saudável e ter uma rotina com horários são práticas essenciais. Além disso, manter-se conectado à espiritualidade, quando isso fizer parte da vida da pessoa, pode trazer ainda mais equilíbrio. A recuperação é um processo, e manter-se firme exige compromisso diário.

Não se trata apenas de evitar a recaída. Trata-se de construir uma vida nova. Com liberdade, dignidade, autoestima, relações saudáveis e autonomia. Para isso, é fundamental continuar colocando em prática o que foi aprendido na clínica, adaptando tudo à vida aqui fora.

Quem está saindo de um tratamento precisa saber: esse é só o começo. A caminhada continua, e ela pode ser bonita, cheia de superações e conquistas. Mas isso exige presença, disciplina e verdade.

E para quem busca apoio, existem grupos gratuitos disponíveis, tanto para quem está em recuperação quanto para familiares. Participar desses espaços é uma forma de continuar fortalecido e em contato com outras pessoas que entendem essa jornada. Ninguém precisa fazer tudo sozinho.

Referências:

Miller, W. R., & Rollnick, S. (2013). Entrevista Motivacional: Ajudando pessoas a mudar.

Organização Mundial da Saúde (OMS). (2004). Neuroscience of psychoactive substance use and dependence. Geneva: WHO.

NA – Narcóticos Anônimos. (2022). Texto Básico.

Alcoólicos Anônimos. (2022). O Livro Azul de A.A.

Blog

Informações sobre prevenção, tratamento e recuperação da dependência química e alcoolismo

Este site usa cookies do Google para fornecer serviços e analisar tráfego.Saiba mais.