Pornografia como Dependência: Desafios Clínicos e Alternativas Terapêuticas
05/08/2025

Por Raique Almeida
O consumo excessivo de pornografia tem se tornado uma preocupação crescente entre profissionais da saúde mental, sendo cada vez mais enquadrado no campo das dependências comportamentais. Embora ainda não exista um consenso unânime na comunidade científica sobre a classificação do vício em pornografia como um transtorno formal, diversos estudos indicam que o uso compulsivo desse conteúdo pode provocar prejuízos significativos na vida afetiva, sexual, social e profissional dos indivíduos.
Segundo Carnes (2001), o vício sexual, incluindo o consumo compulsivo de pornografia, pode ser compreendido como uma perda de controle frente a impulsos sexuais, frequentemente acompanhada de sentimentos de culpa, isolamento e deterioração dos relacionamentos interpessoais. Esses comportamentos são mantidos por mecanismos semelhantes aos de outras dependências, como a liberação excessiva de dopamina, proporcionando alívio emocional e prazer imediato, mas com efeitos negativos a longo prazo (Kuhn & Gallinat, 2014).
Os desafios clínicos enfrentados no tratamento desse tipo de dependência são múltiplos. Em primeiro lugar, muitos pacientes apresentam resistência em reconhecer o problema, uma vez que a pornografia é socialmente acessível, legal e, em certa medida, culturalmente normalizada (Griffiths, 2012). Além disso, o uso precoce, facilitado pela internet e dispositivos móveis, contribui para a formação de padrões de comportamento profundamente enraizados.
Dentre as alternativas terapêuticas, destaca-se a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), que visa identificar os gatilhos e padrões de pensamento que sustentam o comportamento compulsivo, substituindo-os por estratégias mais saudáveis de enfrentamento. A abordagem de 12 passos, adaptada de programas como os dos Alcoólicos Anônimos, também tem sido utilizada, promovendo suporte em grupo e foco na abstinência progressiva (Laaser, 2004).
Recentemente, a Terapia Focada na Compaixão (Gilbert, 2010) vem sendo aplicada como complemento ao tratamento de dependências, promovendo o autoconhecimento e a redução da autocrítica, frequentemente associada à culpa presente nos quadros de vício em pornografia. Além disso, programas de mindfulness têm mostrado eficácia na regulação emocional e na diminuição de impulsos automáticos (Garland et al., 2017).
Portanto, embora o vício em pornografia ainda enfrente resistências conceituais e diagnósticas, é evidente que ele pode provocar sofrimento real e merecer atenção terapêutica especializada. O desafio está em construir abordagens que integrem o aspecto clínico, social e ético da questão, acolhendo a complexidade do sujeito contemporâneo diante das novas formas de prazer e conexão.
Referências
Carnes, P. (2001). Out of the Shadows: Understanding Sexual Addiction. Hazelden Publishing.
Griffiths, M. D. (2012). Internet sex addiction: A review of empirical research. Addiction Research & Theory, 20(2), 111–124.
Kuhn, S., & Gallinat, J. (2014). Brain structure and functional connectivity associated with pornography consumption: The brain on porn. JAMA Psychiatry, 71(7), 827–834.
Gilbert, P. (2010). The Compassionate Mind: A New Approach to Life's Challenges. New Harbinger Publications.
Laaser, M. (2004). Healing the Wounds of Sexual Addiction. Zondervan.
Garland, E. L., Froeliger, B., & Howard, M. O. (2017). Mindfulness training targets neurocognitive mechanisms of addiction at the attention-appraisal-emotion interface. Frontiers in Psychiatry, 8, 291.