Entre o Erro e o Perdão: Reflexões Sobre a Natureza Humana e a Possibilidade de Recomeço
29/06/2025

Por Raique Almeida
A reflexão sobre o erro humano e o perdão é essencial para compreender os processos emocionais e éticos que envolvem a convivência social. Partindo da ideia de que errar é uma característica universal da condição humana, torna-se evidente que, mais do que evitar falhas, é necessário saber como lidar com elas. A postura diante do erro, tanto próprio quanto alheio, revela maturidade emocional e disposição para o crescimento pessoal. É nesse sentido que o perdão se apresenta como um instrumento de cura e transformação não apenas do outro, mas sobretudo de quem perdoa.
Perdoar exige compreender que o outro também é falho, assim como qualquer pessoa. Isso não implica concordar ou esquecer o que foi feito, mas desenvolver a capacidade de lembrar sem dor, reconhecendo o erro como parte de um processo de aprendizagem. No entanto, é importante diferenciar as circunstâncias em que os erros ocorrem. Há grande diferença entre quem age com plena consciência de que está fazendo algo errado e quem se equivoca ou se engana sem intenção de causar dano. Entender essas nuances é essencial para não cair em julgamentos apressados ou injustos.
Ainda assim, quando o erro se repete de forma deliberada e sem arrependimento verdadeiro, ele deixa de ser visto como uma falha humana compreensível e passa a ser uma escolha consciente. Nessas situações, o perdão e a concessão de uma nova oportunidade devem ser avaliados com cautela. Reiterar o perdão a alguém que não demonstra disposição para mudar pode tornar-se um ciclo prejudicial para quem está sempre disposto a oferecer uma segunda chance. O perdão genuíno pressupõe que haja, por parte de quem erra, arrependimento e esforço contínuo para agir de maneira diferente.
Outro aspecto relevante nessa discussão envolve a exposição pública do erro. Em tempos de redes sociais e cultura do cancelamento, muitas pessoas têm seus comportamentos analisados e julgados por milhões. Quando isso ocorre, o erro deixa de ser um episódio íntimo para se transformar em espetáculo. A exigência por mudanças rápidas e visíveis, imposta pela opinião pública, pode levar à simulação de arrependimento, sem que exista de fato um processo interno de transformação. Essa pressão, em vez de incentivar o amadurecimento, frequentemente abala a autoestima e dificulta a reflexão profunda sobre os próprios atos.
Mudanças verdadeiras não são imediatas, nem podem ser impostas de fora para dentro. Elas exigem tempo, consciência e uma decisão pessoal de rever posturas. Perdoar, portanto, não é esquecer ou aceitar tudo sem critérios, mas sim um gesto que envolve discernimento, empatia e responsabilidade. É possível oferecer uma nova chance, mas isso deve estar atrelado a sinais concretos de mudança e arrependimento. Do contrário, corre-se o risco de perpetuar comportamentos destrutivos sob o disfarce de compaixão.
Em síntese, o perdão é um caminho de liberdade emocional, tanto para quem o concede quanto para quem o recebe. No entanto, ele deve ser oferecido com sabedoria e equilíbrio, respeitando os próprios limites e reconhecendo que, embora todos possam errar, nem todos estão dispostos a mudar. Por isso, perdoar é também um ato de coragem e autoconhecimento, que exige olhar para o outro sem ignorar a própria dignidade.
Referências:
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