O Uso de Drogas e Sua Relação Com o Altas Habilidades/Superdotação: Vulnerabilidades e Desafios
11/09/2025

Por Raique Almeida
O fenômeno do uso de substâncias psicoativas apresenta interfaces complexas com diferentes condições psicológicas e sociais, incluindo os sujeitos com Altas Habilidades/Superdotação (AH/SD). Embora esses indivíduos apresentem características cognitivas diferenciadas, como pensamento criativo, alta capacidade de abstração e desempenho acima da média em determinadas áreas, também podem manifestar vulnerabilidades emocionais e sociais que favorecem comportamentos de risco, entre eles o uso problemático de drogas (FREITAS; PÉREZ, 2012). Essa relação torna-se ainda mais relevante no contexto da saúde mental, considerando que a pressão social e a dificuldade de integração em grupos podem estimular o recurso a substâncias como tentativa de regulação emocional.
Estudos apontam que pessoas com AH/SD frequentemente vivenciam um sentimento de inadequação frente às expectativas sociais, o que pode gerar angústia, ansiedade e isolamento (ALENCAR; FLEITH, 2001). Nesses casos, o uso de drogas surge como uma forma de atenuar a intensidade das experiências internas, funcionando como um mecanismo de enfrentamento disfuncional. A literatura também indica que a sensibilidade exacerbada e a tendência à introspecção presentes em alguns superdotados ampliam a vulnerabilidade ao sofrimento psíquico, aumentando a probabilidade de buscar substâncias como estratégia de fuga (GUENTHER, 2006).
Além disso, há de se considerar que, em contextos educacionais, a falta de reconhecimento e estímulo adequado pode intensificar frustrações e sentimentos de incompreensão. Quando o potencial não é acolhido, o sujeito com AH/SD pode desenvolver trajetórias marcadas por desmotivação e comportamentos de risco, entre os quais se destaca o uso de drogas (PÉREZ; FREITAS, 2016). Dessa forma, a ausência de políticas públicas e práticas pedagógicas voltadas à valorização da singularidade desses indivíduos torna-se um fator de risco indireto para a dependência química.
É fundamental compreender que a superdotação não implica imunidade a problemas emocionais ou sociais ao contrário, o excesso de expectativas externas pode gerar sobrecarga e sofrimento psíquico. Nesse sentido, a interface entre AH/SD e uso de drogas deve ser analisada a partir de uma perspectiva multidisciplinar, que integre psicologia, educação e saúde. Como destaca Boff (2002), o cuidado integral exige olhar para o ser humano em sua totalidade, contemplando corpo, mente e espírito. Essa abordagem é essencial para o desenvolvimento de estratégias de prevenção ao uso de drogas entre indivíduos superdotados, favorecendo não apenas o rendimento acadêmico, mas também a saúde mental e a qualidade de vida.
Assim, torna-se urgente que programas de atenção à saúde mental considerem a singularidade dos sujeitos com AH/SD, oferecendo suporte emocional, espaços de acolhimento e estratégias pedagógicas que reduzam os riscos associados ao uso de drogas. Reconhecer a complexidade dessa relação é um passo fundamental para promover políticas inclusivas e ações integrativas de cuidado, evitando que o potencial criativo e intelectual desses indivíduos seja obscurecido pela dependência química.
Referências
ALENCAR, Eunice M. L. Soriano de; FLEITH, Denise de Souza. Superdotados: determinantes, educação e ajustamento. Petrópolis: Vozes, 2001.
BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela Terra. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.
FREITAS, Soraia Napoleão; PÉREZ, Susana Graciela Pérez Barrera. Altas habilidades/superdotação: atendimento especializado. Brasília: MEC/SEESP, 2012.
GUENTHER, Zenita Cunha. Um olhar para as altas habilidades/superdotação. Curitiba: Juruá, 2006.
PÉREZ, Susana Graciela Pérez Barrera; FREITAS, Soraia Napoleão. Cultura e superdotação: um estudo sobre a diversidade no atendimento. Porto Alegre: Mediação, 2016.