Uso de Drogas e Transtorno de Ansiedade Generalizada: Uma Relação de Risco e Comorbidade
10/09/2025

Por Raique Almeida
O Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) caracteriza-se pela presença de preocupações excessivas, persistentes e de difícil controle, frequentemente acompanhadas de sintomas físicos como tensão muscular, insônia e irritabilidade. Essa condição, de natureza crônica, compromete de forma significativa a qualidade de vida dos indivíduos que dela sofrem. Nesse contexto, o uso de drogas surge como um fator de risco e de agravamento do quadro ansioso, estabelecendo uma relação de comorbidade que merece atenção especial tanto da clínica psicológica quanto da psiquiatria.
Estudos apontam que muitos indivíduos recorrem ao uso de substâncias psicoativas como tentativa de aliviar sintomas ansiosos, prática conhecida como automedicação (Zaleski, 2006). Drogas como álcool, maconha e benzodiazepínicos, quando utilizadas sem orientação profissional, podem inicialmente gerar sensação de relaxamento, mas em longo prazo tendem a agravar os sintomas ansiosos, aumentar a dependência e dificultar o tratamento do TAG. De acordo com Andrade et al. (2012), a prevalência do uso de substâncias é significativamente maior em pessoas com transtornos de ansiedade, indicando uma associação estreita entre essas condições.
A explicação para essa relação pode ser encontrada nos mecanismos neurobiológicos que envolvem tanto a ansiedade quanto a dependência química. O sistema de neurotransmissores, especialmente o GABA e a dopamina, desempenha papel central na regulação da ansiedade e no reforço do uso de substâncias psicoativas. Quando uma droga é consumida, promove alterações químicas no cérebro que podem momentaneamente reduzir a ansiedade, entretanto, a longo prazo, tais alterações prejudicam o funcionamento neural, gerando maior vulnerabilidade a crises ansiosas (Laranjeira e Romano, 2004).
O ciclo estabelecido entre ansiedade e uso de drogas é de retroalimentação o sujeito utiliza a substância para controlar sintomas ansiosos, mas acaba por intensificá-los, levando a um consumo mais frequente e a um risco maior de dependência. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2019), a comorbidade entre transtornos de ansiedade e uso de substâncias está entre os maiores desafios de saúde mental na atualidade, pois implica maior sofrimento psíquico, dificuldades sociais e menor adesão a tratamentos.
Assim, o tratamento do TAG em indivíduos que fazem uso de drogas requer abordagem integrada e interdisciplinar, que considere tanto a dependência química quanto os sintomas ansiosos. Intervenções psicoterápicas, como a terapia cognitivo-comportamental, aliadas ao uso criterioso de medicamentos e a programas de prevenção ao abuso de substâncias, têm se mostrado eficazes (Kapczinski. 2014). A compreensão dessa relação é essencial para que profissionais da saúde desenvolvam estratégias que visem não apenas o alívio imediato da ansiedade, mas também a promoção de uma vida mais saudável e livre da dependência.
Portanto, a articulação entre uso de drogas e TAG evidencia a complexidade das relações entre saúde mental e comportamento aditivo. Trata-se de um fenômeno que exige compreensão ampla, baseada em evidências científicas, e que aponta para a necessidade de políticas públicas voltadas à prevenção, ao tratamento adequado e à reinserção social de indivíduos afetados por essa dupla condição.
Referências
ANDRADE, L. H.; WANG, Y. P.; ANDREONI, S. et al. Mental disorders in megacities: findings from the São Paulo megacity mental health survey, Brazil. PLoS Medicine, v. 9, n. 2, p. 1-13, 2012.
KAPCZINSKI, F.; QUEVEDO, J.; IZQUIERDO, I. (org.). Bases biológicas dos transtornos psiquiátricos. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
LARANJEIRA, R.; ROMANO, M. Drogas: classificação e efeitos no organismo. In: DUNN, J.; LARANJEIRA, R. (org.). Álcool e drogas: uso, abuso e dependência. São Paulo: Atheneu, 2004. p. 15-33.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Relatório sobre saúde mental no mundo. Genebra: OMS, 2019.
ZALESKI, M.; LARANJEIRA, R.; OLIVEIRA, M. S. et al. I Levantamento Nacional sobre os Padrões de Consumo de Álcool na População Brasileira. Brasília: Secretaria Nacional Antidrogas, 2006.